domingo, 22 de novembro de 2009

Multiplicidade brasileira


Débora Schmitt


Esse ano eu resolvi fazer intercâmbio. Mas não para estudar, queria trabalhar em algum lugar que aceitasse trabalho voluntariado. Procurei uma agência de viagens, escolhi um destino, fiz um currículo e comecei a busca por ONGs e empresas do local selecionado. Não demorou a aparecerem às oportunidades, já que, acredito eu, não são muitas as pessoas que se candidatam a passar as férias em um país sul americano, abdicando das maravilhosas praias brasileiras e merecido descanso, para se empenhar em lutas ambientais ou programas de proteção aos jovens traumatizados com a guerra de seu país. Muitas eram as opções...Guia nas ruínas de Machu Picchu, grupo protecionistas de animais na Argentina, ONG defensora dos direitos sexuais dos ninõs no Uruguai, e aí por diante. Até então, tudo dentro dos conformes já esperados. Entretanto, uma das possibilidades me chamou atenção: “Temos a honra de convidá-la a representar seu país diante nossos alunos nas aulas de integração social”. Gastei um bom tempo tentando imaginar de que forma eu representaria o Brasil. Imagens? Músicas? Histórias? Foi quando me veio à descrição do trabalho que eu deveria realizar com as crianças, e este consistiria basicamente em expor a identidade cultural e nacional do Brasil, para que estes aprendessem culturas estrangeiras. Para tanto, fui buscar uma breve definição sobre esses conceitos e cheguei à conclusão de que a identidade nacional é formada pelo conjunto de identidades e valores culturais e de influências de outros povos, caracterizando assim, a “cara” do país, aquilo que o assinala como uma nação.
A partir de então, já tentando me imaginar na função de transmitir às crianças um pouco do meu local de origem, tive a primeira prova de que a identidade nacional realmente existe. Imaginar-se em um país estrangeiro, a milhares de quilômetros de casa, uma língua que não a sua, uma cultura totalmente diferente em todos os aspectos, uma certa vulnerabilidade pairando no ar...Mas espera aí...Por que eu estava ali? Não poderia me esquecer disso: para falar do Brasil. O MEU país, o MEU Brasil (Pausa irreverente pra uma sambadinha, por que eu sou filha de Deus e...brasileira! Vamos lá: “Brasil, meu Brasil brasileiro, meu mulato inzoneiro, vou cantar-te nos meus versos...”). Voltando ao meu Brasil, eu percebi então um forte sentimento de pertença. Por mais que não estivesse dentro dos limites territoriais do meu país, carregava dentro de mim as marcas dos valores culturais por ele me concedido, valores estes que formam a identidade nacional, a identidade daquilo que somos e representamos, a identidade de nação. Aí está o primeiro tópico a ser abordado nas aulas de cultura brasileira que pode ser um bom item de identidade nacional: brasileiro que é brasileiro é sempre brasileiro! Que isso??? Quanta brasilidade para uma frase só! Entrelinhas: um típico brasileiro pode não ter toda aquela simpatia e cordialidade que os gringos pregam por aí, pois convenhamos que acordar às 7 da amanhã pra cobrir pauta e descobrir que a matéria do dia é sobre os fãs do que RBD organizam passeata contra o fim do grupo não é a vida que todo mundo sempre desejou, e você tem uma grande possibilidade de ganhar uma patada de bom dia. Entretanto, convide um brasileiro a assistir o jogo da copa do mundo, Brasil x Argentina, às 3 da manhã de uma segunda-feira, lá no barraco da tia Zéfa numa TV 10 polegadas. Convide-o para o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro ou mesmo para aquela farra de carnaval que vai rolar ali no boteco da esquina. Talvez para comer no domingo uma feijoada regada de pé e rabo de porco, com um feijãozinho preto esperto e depois chegar na roda de pagode do Zé e ver a mulata requebrando o famoso “bumbum” da morena brasileira. Ah meu irmão, se o camarada não aceitar, eu viro argentina! Diga prazer, te apresento o sentimento de pertença do brasileiro, o senso de nação presente nos indivíduos quando estes querem e precisam mostrar a cara desse Brasil à fora, a hora que cada indivíduo abre sua porta, seja do barraco da favela lá do morro ou da mansão do Alphaville Living Resort, dá a mão pro seu vizinho e em uma voz só todos cantam: “Brasil! Mostra tua cara, quero ver quem paga...”. Esse é, na minha singela opinião, o maior traço do brasileiro, que pode até não ser um fator que sirva, cientificamente, para caracterizar a identidade nacional, mas que cada brasileiro tem isso dentro de si, isso eu sei que tem. E se cada um compartilha desse sentimento, ele acaba por fazer parte da nossa cultura, e assim vai...
Mas o que mais falar do Brasil? Após todo esse surto de patriotismo e nacionalismo, eu diria que o país teve sua colonização fortemente influenciada, o que acabou por formar uma nação extremamente heterogênea em termos culturais, históricos e ideológicos. Não que isso seja ruim, acabamos por herdar diversas características, formado um traço cultural amplo, eclético e adptável. De toda essa miscigenação, nasceu um Brasil de múltiplas cores, sons, tons e paladares. O Brasil de uma beleza exótica estampada tanto nos traços do negro de largos beiços e pele cor de jambo, até nas peles rosadas e olhos claros dos brancos. O Brasil de uma sonoridade encantadora, misturando ritmos e letras em uma combinação perfeita e envolvente. O Brasil dos sabores diversos, reservando em cada parte de seu território novas surpresas e gostos diferentemente marcantes. O Brasil das belezas naturais expressas pela exuberante fauna e flora dos campos, matas, praias e cerrados. O Brasil da nação brasileira, uma nação unida pela geografia e solidificada pela cultura, acolhendo conceitos, definições e interpretações, uma nação que aprendeu a viver com as diferenças transformando-as em qualidades para os brasileiros. Uma nação que, apesar de miscigenada, se une em uma única língua e estufa o peito ao dizer: “eu...sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor!!!”.


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